Considerações Finais

Rizomas, redes, tecidos… De muitos fios foram compostas estas Tessituras multimidiáticas, a começar, por linguagens, tecnologias e sexualidades, sendo esse apenas o início das muitas pontas que ainda podem ser puxadas a partir das ideias discutidas ao longo desta pesquisa. Os novelos são, nesse caso, as discussões pós-estruturalistas, a partir das quais sustentei a minha argumentação e, mais que isso, a forma como compus este texto. Com o objetivo de problematizar o uso de diferentes artefatos multimídias, sob a ótica dos multiletramentos e das relações de intermultimidialidade, que podem ser estabelecidas entre textos, imagens, vídeos, entre outros, busquei criar possibilidades de reflexão sobre as temáticas de relações de gêneros e sexualidades.

As metas para o alcance do objetivo proposto foram instauradas a partir de trocas de ideias, leituras, discussões e ressignificações de conceitos e teorias. Essa discussão começou com uma ressignificação conceitual, a partir da escolha pela expressão relações de gêneros, com ambos os termos no plural, para demonstrar que os gêneros estão relacionados a ações e atitudes próprias de cada pessoa. Outro posicionamento que assumi, a partir de diferentes pressupostos teóricos, foi recontextualizar a terminologia artefatos multimídias e cunhar, para as relações entre eles estabelecidas, o termo intermultimidialidade.

A aplicação de tais relações se tornou, então, a metodologia para o curso de extensão Corpo, saúde, sexualidades. Com duração de 40 horas, o curso teve formato híbrido, sendo dividido em dois encontros presenciais (10 horas) e em atividades realizadas virtualmente (30 horas), utilizando, para isso, o Facebook como plataforma de ensino-aprendizagem. O curso foi voltado para licenciandas/os da Universidade Federal de Lavras (UFLA) e contou com a inscrição de 70 pessoas, as quais foram divididas em dois grupos: Furta-cor e Purpurina, para a realização de atividades.

Contribuir para a formação docente sobre as temáticas relações de gêneros e sexualidades foi a proposta do curso de extensão, tendo em vista que esses temas ainda não são discutidos com a profundidade necessária, tanto no ensino superior quanto na educação básica. Dessa forma, professoras/es acabam chegando, em sala de aula, com concepções teóricas e conhecimentos sobre metodologias de ensino ainda limitados e não sabem lidar com situações cotidianas que, ao não serem problematizadas na escola, muitas vezes se transformam em casos de discriminação, opressão e violência.

Além disso, com a realização do curso utilizando uma rede social como o Facebook, quis demonstrar como as Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC) podem ser utilizadas na educação, sobremaneira, para se aplicar o ensino híbrido, que busca rever os papéis de alunos/as e professores/as, para que haja mais interação e protagonismo estudantil na organização das aulas.

Com base nessa premissa, o Curso Corpo, saúde, sexualidades aconteceu em fevereiro e março de 2017, depois de uma expressiva divulgação: com vídeos e postagens em redes sociais; notícias veiculadas no site institucional, nas redes sociais e na Rádio da UFLA; por meio de cartazes distribuídos pela Universidade e com convites às/aos licenciandas/os, nas salas de aula. Tanto pela publicidade quanto por ser um tema que desperta o interesse dos/as alunos/as, as inscrições se esgotaram rapidamente, tendo sido ampliadas de 50 para 70 vagas.

As atividades foram divulgadas, por meio da solicitação para que os/as participantes as realizassem promovendo relações de intermultimidialidade entre diferentes textos, vídeos, músicas, imagens, entre outros, a fim de que o grupo pudesse analisar, discutir e problematizar questões voltadas para as relações de gêneros e sexualidades. Mesmo que, das 70 pessoas, apenas 22 tenham realizado atividades, sendo 8 com participação realmente significativa, as produções advindas do curso geraram um material empírico rico e diversificado.

A participação aquém do esperado demonstrou, ainda, que propostas como a que fiz nesta pesquisa são válidas, significativas e necessárias, justamente para que se busque uma mudança no paradigma atual da educação. Para que novas metodologias sejam utilizadas, é preciso haver, não apenas uma mudança de concepções teóricas, mas atitudes inovadoras de professoras/es e alunas/os, que culminem em autonomia para a busca de novos aprendizados. Cada vez mais diminui o espaço para aulas em que apenas uma pessoa fala, transmitindo informações. O futuro da educação está em processos colaborativos e dialógicos, em que todas as pessoas envolvidas partilham conhecimento.

Pensando nisso, discuto como um texto, um filme, uma entrevista, uma postagem, uma referência filosófica, um gráfico, uma música, uma crônica, uma imagem, uma série, um livro e um clipe se tornaram fios de uma tessitura que demonstrou como foram ricas as discussões promovidas pelo Curso Corpo, saúde, sexualidades. Essas tessituras foram problematizadas sob a ótica das teorias pós-críticas e das relações de intertextualidade, diálogo que foi possível graças à análise textual discursiva.

As significações e ressignificações possibilitadas por esse material indicam como um curso de extensão pode contribuir para a formação docente. Fato esse comprovado pela aplicação de uma avaliação diagnóstica, que reformulou a segunda metade do curso, e de uma avaliação final. Ambos os momentos avaliativos reuniram opiniões e informações das/os participantes, indicando serem as relações de gêneros e sexualidades temas que precisam ser discutidos na formação docente. E não apenas aí.

Afinal, se uma educação de qualidade é aquela que procura contribuir para que as pessoas evoluam, isso inclui as discussões sobre como a sociedade se organiza e como os seres humanos interagem. Para tanto, é preciso respeito e diálogo. E isso inclui falar sobre como as relações de gêneros e as sexualidades refletem as subjetividades humanas em todas as suas nuances de cores, formas, sons, sabores, percepções…

O diálogo entre pessoas pode começar pelo diálogo entre artefatos multimídias, cujas leituras, discussões, problematizações e criação de intermultimidialidades se transformam em metodologia que permite discussões críticas e amplas sobre relações de gêneros e sexualidades. E não apenas sobre esses assuntos, mas abarcando qualquer outro tema. Além disso, essa prática pedagógica pode ser utilizada com qualquer faixa etária, de acordo com os objetivos de ensino-aprendizagem que o/a professor/a tenha.

Os fios se tornaram trama e as tramas viraram rede, tecido que evoca o infinito, as múltiplas possibilidades de interligar, aproximar, compartilhar… E isso pode ser feito por meio do site www.ded.ufla.br/tessituras, onde disponibilizei esta pesquisa, desejando que esses entrelaçamentos continuem…

Justamente por essa característica de continuidade desta pesquisa, ela não se encerrou na defesa, ocorrida em 13 de julho de 2017, o que me permitiu o acréscimo do que se poderia chamar de um epílogo ao que já fora apresentado. Assim, por sugestão de um dos integrantes da banca, o professor Ronei Ximenes Martins, há que se discutir, ainda, o fato de este trabalho não se restringir apenas a uma dissertação, já que ele reúne: um processo investigativo; a organização de um curso de extensão; a elaboração de um relatório técnico desse curso, descrevendo detalhadamente como ele foi concebido; a análise crítica do material empírico produzido nesse curso, inclusive por meio de uma avaliação diagnóstica que permitiu repensar a sua organização; um site, a fim de possibilitar a continuação das discussões propostas pela pesquisa e, também, como uma forma de devolutiva aos participantes; e, ainda, esta pesquisa constitui-se uma articulação com as diferentes formações propostas pelo Programa do Mestrado Profissional em Educação, tornando-se, portanto, resultado das relações de ensino-aprendizagem dos dois anos de curso.

A partir desses apontamentos, pode-se ressaltar, portanto, a relevância científica e social desta pesquisa, devido à necessidade de se discutir a educação mediada por tecnologias e a formação docente, sobretudo no que se refere às relações de gêneros e sexualidades. Exatamente por isso, foi necessário realizar uma pesquisa exploratória, sem uma hipótese predefinida, fazendo com que os rumos da pesquisa se delineassem na medida em que a pesquisa foi acontecendo, depois de se ir a campo para entender o fenômeno pesquisado.

Dessa feita, mais que apenas um resumo da pesquisa, faz-se necessário problematizar: os limites da investigação; as dificuldades encontradas; as críticas e contribuições da pesquisa e do Mestrado Profissional em Educação para mim; as possíveis contribuições para a área do conhecimento (educação/formação de professores); as possibilidades de aprofundamento da investigação; e a indicação de novas questões de pesquisa a serem desenvolvidas.

A investigação teve como limitadores a quantidade de pessoas que participaram, de fato, do Curso Corpo, saúde, sexualidades e os/as participantes não demonstrarem estar preparados/as e dispostos/as a trabalhar com a metodologia ativa proposta. Entendo que, quanto maior a interação entre os/as participantes, mais discussões aconteceriam e mais relações de intermultimidialidade seriam possíveis, as quais, por sua vez, gerariam novas discussões e possibilidades de aprendizagem.

As dificuldades encontradas ao longo da pesquisa foram o curso de extensão ter coincidido com o término do período letivo da UFLA, o que, segundo as/os próprias/os participantes, dificultou a realização das atividades. Junto a isso, o tempo de dois anos do Mestrado, o que impossibilitou que se pudesse organizar uma nova edição do curso de extensão, ou mesmo que o curso fosse realizado de modo mais gradativo. No campo da educação, discutir formação não é algo que se faz de modo rápido, por ser necessário analisar, não um fato, mas um processo.

Tanto a pesquisa quanto o Mestrado contribuíram para a minha formação como pesquisadora e para despertar ainda mais a minha vontade de tentar entender e contribuir para a educação. Além disso, foi significativo poder articular, ao longo da pesquisa, três das cinco áreas de interesse do Programa: Educação mediada por tecnologias, Linguística Aplicada e Gênero e diversidades na educação (as outras duas são: Ciências, cultura e ambiente e Teoria crítica e educação).

Por isso, esta pesquisa pretendeu contribuir para a discussão acerca da necessidade de uma educação que, verdadeiramente, incorpore as tecnologias em suas práticas diárias, seja por meio da utilização de sites, textos virtuais, vídeos, entre outros recursos, por meio do uso das redes sociais, para que haja mais interação, real e virtual, entre alunas/os e professoras/es. Mas que, nem por isso, deixe de ser uma educação mais humana, já que se buscou fornecer elementos que colaborassem para a formação de docentes que saibam fazer uso dessas tecnologias, mas que, antes, consigam discutir a importância do respeito às diversidades. E isso se torna mais viável quando o/a professor/a tem condições de levar para a escola as muitas discussões possíveis sobre as temáticas relações de gêneros e sexualidades.

Como as mudanças são próprias dos seres humanos, essas discussões são inúmeras e provavelmente nunca terão fim, fazendo com que sejam necessárias constantes pesquisas como esta, a qual, justamente por isso, não termina aqui. Esta investigação suscita aprofundamentos que possibilitarão novas questões de pesquisa, como: que outras metodologias ativas podem ser utilizadas para as discussões sobre relações de gêneros e sexualidades? Como a linguagem virtual se diferencia e é utilizada nos processos de ensino-aprendizagem? Que outras discussões podem ser feitas em relação às identidades das/os participantes do curso? Como a autonomia das/os participantes interfere nas metodologias escolhidas? Que outras relações de intertextualidade e interdiscursividade podem ser estabelecidas? Se o Facebook não funciona como plataforma de ensino-aprendizagem, que outra ferramenta pode ser utilizada? Ela já existe? Se não existe, o que precisa ter para atender aos propósitos do ensino híbrido?

Cada uma dessas perguntas são fios que poderão trançar novos tecidos, em um mundo de infinitas possibilidades…

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